ATA DA DÉCIMA SÉTIMA SESSÃO SOLENE DA SEGUNDA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA LEGISLATURA, EM 02.08.1990.

 


Aos dois dias do mês de agosto do ano de mil novecentos e noventa reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre, em sua Décima Sétima Sessão Solene da Segunda Sessão Legislativa Ordinária da Décima Legislatura, destinada a homenagear o Centenário de Nascimento de Adel Carvalho, conforme Requerimento, aprovado pela Casa, do Ver Leão de Medeiros. Às dezessete horas e quinze minutos, constatada a existência de “quorum”, o Sr. Presidente declarou abertos os trabalhos e solicitou aos Líderes de Bancada que conduzissem ao Plenário as autoridades e personalidades presentes. Compuseram a Mesa: Ver. Lauro Hagemann, 1º Secretário da Câmara Municipal de Porto Alegre, presidindo os trabalhos da presente Sessão; Srª Tereza Carvalho, Viúva de Adel Carvalho; Srª Silvia Regina Carvalho Duhá, filha de Adel Carvalho; Dr. Roberto Duhá, Genro de Adel Carvalho; Ver. Kleber de Castro, Presidente da Liga da Defesa Nacional; Dr. Manoel Varela, Coordenador da Comissão Promotora das Homenagens a Adel Carvalho; Dr. Anton Biedermann, Presidente da Associação Comercial de Porto Alegre e da Federasul; Jornalista Firmino Cardoso, representando a Associação Riograndense de Imprensa; Ver. Leão de Medeiros, proponente da Sessão e, na ocasião, Secretário “ad hoc”. Após, o Sr. Presidente pronunciou-se acerca do evento e concedeu a palavra ao Ver. Leão de Medeiros que, em nome da Casa, discorreu sobre a trajetória de vida de Adel Carvalho, destacando sua atuação como eminente empresário, jornalista e político gaúcho. Em continuidade, o Sr. Presidente concedeu a palavra a Srª Silvia Regina Carvalho Duhá, que agradeceu a homenagem prestada pela Casa a seu pai. Após, o Sr. Presidente agradeceu a presença de todos e, nada mais havendo a tratar, levantou os trabalhos às dezessete horas e trinta e sete minutos, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pelo Ver. Lauro Hagemann e secretariados pelo Ver. Leão de Medeiros, Secretário “ad hoc”. Do que eu, Leão de Medeiros, Secretário “ad hoc” determinei fosse lavrada a presente Ata que, após lida e aprovada, será assinada pelos Senhores Presidente e 1º Secretário.

 

 


O SR. PRESIDENTE: Declaro  abertos os trabalhos desta presente Sessão Solene, requerida pelo Ver. Leão de Medeiros e destinada a homenagear o Centenário de nascimento de Adel Carvalho, ex-Vereador desta Casa, um cidadão prestimoso que estaria completando, evidentemente neste ano de 1990, 100 anos de idade e que por aqui passou e deixou um longo rastro de amizades, de trabalhos, de propostas, que honrou não só o mundo político, mas sobretudo na sua atividade múltipla de homem do comércio e de jornalista. Um homem da comunicação.

Eu tenho a honra de presidir esta Sessão, porque o Presidente da Casa, o Ver. Valdir Fraga, teve problemas particulares e me pediu que o substituísse. E eu sinto sumamente satisfeito porque, dos 33 Vereadores atualmente em exercício no Município de Porto Alegre, sou o único que convivi com Adel Carvalho na Câmara Municipal nos idos de 1964, 1965 e 1966. Revejo, aqui, com muita satisfação, a figura do ex-Vereador Larry Pinto de Faria que também fazia parte da Câmara naquela ocasião e do Dr. Homero Ferrugem. Em nome da Casa e de todas as suas Bancadas, falará o Ver. Leão de Medeiros, autor da Proposição.

 

O SR. LEÃO DE MEDEIROS: Ex-Vereador Larry Pinto de Faria e Homero Ferrugem Martins, ex-Deputado Alceu Martins, Srs. Vereadores, minhas Senhoras e meus Senhores. (Lê.) Estamos homenageando hoje a memória de um homem excepcional, que não era gordo nem magro, nem baixo nem alto. A sua excepcionalidade vinha do íntimo. Quem o visse passar na rua nem suspeitaria que tivesse andado rente a Adel Carvalho, o cronista de todos os jornais de Porto Alegre, cuja prosa reproduzia de maneira tão fácil, tão clara e objetiva tudo aquilo que cada um dos leitores gostaria de dizer, se tivesse acesso às colunas de jornal.

Que havia de notável naquele homem comum que cumprimentava quase todas as pessoas quando passava, lépido, pela Rua da Praia? Alguns talvez lembrarão os olhos sempre sorridentes e cintilantes por traz das lentes dos óculos. Outros registrarão sua persistente adesão à gravata borboleta. Os mais chegados certamente lembrarão de que, em certo período, usou um cavanhaque agressivo na época em que as barbas haviam desaparecido e apenas se usava a leve mancha de um bigode sobre o lábio. Nas Sessões Solenes envergava um traje preto, única concessão, talvez, aos velhos tempos.

Quem, como eu, nasceu cinqüenta anos depois de Adel Carvalho, já o conheceu como um austero comerciante que girava em torno do centro de Porto Alegre. Poucos de nós, deste período, poderíamos imaginar Adel Carvalho de outra ótica. Mas aquele severo rio-grandino guardava ainda, e guardaria até dezembro de 1972, o espírito matreiro do guri papa-areia, uma liberdade de alma que nasceu com ele, uma ironia fina, e apesar disso, às vezes ferina e uma inabalável confiança no próximo. Quem o conheceu, e quem lê hoje suas crônicas no livro compilado com inteligência e sensibilidade por Manoel Varela, sente que aquele homem simples era um ser complexo, capaz de amar todas as pessoas, e perdoar todos os seus deslizes, não sem antes colocá-las à mercê de sua crítica afável.

Como bem anota Varela, o homem tinha três facetas que refletiram de maneira irisada o sol de seu tempo: o empresário, o jornalista e o político.

Foi como empresário que veio para Porto Alegre, abandonando a areia quente do Rio Grande e os grandes ventos da praia do Cassino. Era um organizador, e na esteira de seu trabalho deixou várias empresas em funcionamento, às vezes como sócio, às vezes como incrementador de novos negócios.

Cedo, Adel Carvalho, descobriu que as empresas, como tudo na vida, nascem, crescem e morrem, mas parece que ele só se interessou pelas duas etapas iniciais: criou empresas e fê-las prosperar, fossem suas ou de amigos ou sócios. A liquidação (expressão usada até a década de 1950) de algumas destas empresas não o abalava. Constituía-se até em um novo estímulo. Daí por que foi natural que ascendesse no ramo dos negócios até chegar a presidente da Associação Comercial de Porto Alegre. Afinal, sabia de tudo sobre o ramo.

Outra faceta mostra-nos Adel Carvalho como político. Foram fases  meteóricas que corresponderam a momentos de ira de um homem honesto. De vez em quando aceita o múnus público como uma obrigação a que não poderia se recusar como cidadão prestante. E prestante é outra palavra que se ouve cada vez menos.

Adepto de Borges de Medeiros, não teve empolgação com Getúlio Vargas. O borgismo parecia-lhe legítimo, porque emanava da inabalável honestidade do velho líder republicano. A Revolução de Trinta e o getulismo não teve seu apoio. Dizia, até o fim, que a Revolução fora um fracasso. Talvez tenha tido razão. Para Adel, Getúlio era ditador no seu primeiro “curto espaço de quinze anos” de governo, e não acreditava na conversão do Presidente quando chegou mais tarde ao poder pelo voto. Mas Adel, adversário udenista de Getúlio, não tripudiava sobre o inimigo inerme. Desde a morte de Getúlio jamais se ouviu uma palavra acre do velho contendor.

Até porque palavras acres não constam de suas centenas, talvez milhares de crônicas e manifestações parlamentares. Nesta Câmara, sempre foi um adversário audaz, certo e correto. Não poupava críticas, mas as fazia com dignidade e elegância. Seus ditos ficaram famosos e foram recolhidos por Varela em seu oportuno livro sobre o centenário de Adel Carvalho.

O jornalismo foi a forma de expressão exercida por mais tempo por um homem que já havia nascido com o dom da palavra, e com o dom de usá-la como alavanca, como verruma e como martelo. Na década de 20 começa a escrever nos jornais de Porto Alegre, e o mais importante de então era jornal A Federação. O jornal Correio do Povo foi a alternativa que ficou, mas Adel participou com outros companheiros da fundação do jornal Diário de Notícias. Escreveu ainda no jornal Folha da Tarde, no Jornal do Comércio e no jornal Zero Hora.

De certa forma, o jornalismo acabou por compor a figura nuclear de Adel Carvalho, projetando-se até nossos dias. Fez parte da velha equipe de grandes cronistas cuja obra é o arquivo dos fatos e das interpretações políticas e sociais de seu tempo.

De cabelo branco, com óculos faiscantes, sua eterna gravata borboleta, um ar de eterno avô que todos gostariam de ter como disseram vários cronistas, escrevia suas crônicas à mão, no balcão dos jornais, na mesa dos cafés do Largo dos Medeiros, nos bancos da Praça da Alfândega. A idéia faiscava e se tornava imediatamente no raio que tanto incomodou seus colegas trabalhistas da Câmara Municipal de então. Mas a verdade é que aqueles Vereadores, e muitos estão em plena atuação, como o candidato Alceu Collares, e o meu colega de hoje, Vereador Lauro Hagemann, achavam tediosas as Sessões do Legislativo Municipal quando Adel Carvalho não se manifestava. Ficou famoso um Projeto de Lei, que encaminhou à Câmara, todo em versos.

Muitos, com raro brilho, já traçaram o perfil de Adel Carvalho.

Permitam-me que escolha um que, para mim, tem especial significado. Foi proferido de improviso em 04 de julho de 1961, da tribuna da Assembléia Legislativa.

Disse o orador: “Na imprensa gaúcha destaca-se um jornalista, digo melhor, um colunista que dia-a-dia cresce na admiração de seus leitores. No Correio do Povo, na Folha da Tarde, no Jornal do Comércio, diariamente, o veterano Adel Carvalho – velho Adel – subscreve crônicas justamente apreciadas e aplaudidas pela leveza do estilo, pela graça dos concertos, pela acuidade dos comentários: na atualidade, é ele, sem dúvida alguma, dos mais festejados do periodismo sul-riograndense. Chamei-o de veterano jornalista, de velho Adel.

Certamente, pelo tempo que atua nos jornais de nossa terra, pelos cabelos brancos que lhe envolvem a fronte, bem merece esses adjetivos.

Todavia de que mocidade se revestem os seus artigos; que jovialidade irrompe de sua pena tersa, num português de lei, numa estilística cordial e amena, dotada daquele senso de humor próprio da inteligência superior a serviço da verdade e do interesse público.

Lendo Adel Carvalho, encontro procedência nas assertivas de Ingenieros. Adel Carvalho pode ser um veterano homem de imprensa, um respeitável cidadão – e o é – de cabelos alvacentos. “Mas se a juventude finda somente quando se apaga o entusiasmo, quando se apaga a ousadia de servir a famosos ideais, Adel Carvalho, em verdade, continua um moço, um jovem impregnado daquela inspiração interior que acende no ânimo, como afirma o sociólogo argentino, o desejo do melhor”.

Desculpem-me a emoção. Ao então Deputado Poty Medeiros – meu velho pai – correligionário udenista e amigo fraternal de Adel Carvalho devo o despertar da minha admiração e respeito pelo homenageado desta justa e merecida Sessão Solene.

Adel Carvalho nasceu em Rio Grande, no dia 02 de agosto de 1890, e faleceu em Porto Alegre, com 82 anos, em 22 de dezembro de 1972. Nunca parou de trabalhar. Morreu como mordomo da Santa Casa de Misericórdia, dedicando sua vida, até o derradeiro minuto, ao próximo, a Porto Alegre e ao Rio Grande do Sul.

A ele e seus familiares, em nome do meu Partido, as nossas homenagens. Muito obrigado.

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Tenho a satisfação de conceder a palavra à Srª Silvia Regina Carvalho Duhá, filha do homenageado.

 

A SRA. SILVIA REGINA CARVALHO DUHÁ: Senhores e senhoras, boa tarde. Não sou habituada a falar em público, e acredito que a minha emoção é muito grande também, talvez não saia grande coisa. Mas eu tenho que dizer, tenho que agradecer a todos vocês tudo o que disseram sobre meu pai. Dizer que ele não merecia seria uma falsa modéstia minha. Meu pai era um grande homem, foi um grande homem. E por essas e outras, e quem deveria estar falando a vocês hoje, era minha irmã, única irmã que eu tinha, que hoje, justamente há 35 anos ela se foi e nos deixou. Ela era inteligente, era uma jornalista, não vou procurar substituí-la absolutamente, quero apenas representar. Mas agradeço a todos e vou dizer então aos senhores uma quadrinha: “Neste mundo em que me encanto, ninguém morre totalmente, mortos vivemos enquanto alguém se lembra da gente”. Esta quadrinha é de meu pai, de Adel Carvalho, então vocês podem todos estar certos de que ele está aqui conosco, ele está um pouco vivo hoje, porque lembraram dele. Muito obrigado, em nome dos familiares de Adel, e de meu próprio nome, e dos meus filhos, muito obrigado a todos por esta homenagem. (Palmas.)

(Não revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE: A Câmara Municipal de Porto Alegre, viveu esta tarde um momento de rara emoção. Felizes as comunidades que podem lembrar com tão grata satisfação e emoção a passagem do companheiro, embora decorridos cem anos do seu nascimento e esta emoção, esta satisfação, a Câmara Municipal de Porto Alegre, viveu nesta tarde. Agradecemos a lembrança do Ver. Leão de Medeiros, que foi o proponente desta Sessão, que fez o discurso em nome de toda a Casa, agradecemos especialmente a presença de tantos amigos de Adel Carvalho, de seus familiares, que devem receber esta homenagem como um sinal de agradecimento de Porto Alegre pela passagem deste seu ancestral por esta Casa, e principalmente por esta Cidade, a quem ele serviu da melhor maneira, com uma jovialidade mantida até o último instante de sua vida. Tive a rara ventura de compartilhar por 3 anos da convivência de Adel Carvalho nesta Casa, e ela foi exatamente aquilo que disse o Ver. Leão de Medeiros: um jovem de cabelos brancos. Nunca havia nele um sinal de hostilidade, de contrariedade absoluta, nunca se ouviu dele uma palavra áspera. Era um homem que cultivava o bom humor e sobretudo a convivência pacífica, civilizada e fraterna com seus companheiros de Câmara. Que se sabe ele também conviveu fraternalmente com seus companheiros da Associação Comercial e da Imprensa de um modo geral; de sorte que agradecemos profundamente o comparecimento de todos, especialmente das pessoas que compõem a Mesa, a Srª Teresa Carvalho, viúva do nosso homenageado, a Srª Sílvia Regina Carvalho Duhá, filha do homenageado, Dr. Roberto Duhá, genro do Dr. Adel Carvalho, o ex-Vereador Kleber de Castro, Presidente da Liga de Defesa Nacional, o Dr. Manoel Varela, Coordenador da Comissão Promotora das Homenagens ao Centenário de Adel Carvalho, o Dr. Anton Biedermann, Presidente da Associação Comercial de Porto Alegre e da FEDERASUL, e o Jornalista Firmino Cardoso, representando a Associação Rio-Grandense de Imprensa. Também agradecemos pela presença do ex-Deputado Alceu Martins, do ex-Vereador Larry Pinto de Faria, do Ver. Homero Ferrugem e de tantas outras pessoas que aqui comparecem para se associar a este centenário.

Neste momento, encerramos os trabalhos da presente Sessão.

 

(Levanta-se a Sessão às 17h37min.)

 

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